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Robsons, Daniéis, Silvios e… eu

  • Foto do escritor: Alayê Imirá de Brito
    Alayê Imirá de Brito
  • 14 de jan.
  • 3 min de leitura
Robson, Daniel, e Silvio
Robson, Daniel, e Silvio

Sou apaixonado por futebol. Quis ser jogador e treinei forte para isso. Mas, assim como muitos, não consegui.


Mas, boa parte dos meus ídolos vêm de lá.


A ideia deste texto surgiu assim que o Robinho se entregou para a polícia. Escrevi algumas coisas em alguns papéis que tenho dificuldade de localizar hoje em dia. Talvez eu tenha escondido ou jogado fora, como uma forma de que os meus pensamentos de tristeza fossem para o lixo também.


Na época, foi difícil ter que desmistificar mais um ídolo da minha infância. Essa não foi a primeira, mas eu faria de tudo para que ela fosse a última.


Tive outra desmistificação no ano também. Antes do Robson, tivemos o Daniel Alves que, para não ficar tanto tempo solto depois de ter cometido um crime (assim como Robson ficou), ele foi preso preventivamente.


Até antes de ser preso, Daniel era o atleta de futebol com mais títulos na carreira (esse recorde agora é do Messi). História de sucesso improvável para quem vem de Juazeiro, interior da Bahia.


Robson, para mim, era um dos jogadores de futebol mais divertidos de assistir. Improvável, irreverente, rápido e habilidoso. Campeão de quase tudo e, tão jovem, era camisa 10 do Real Madrid. Outra história de sucesso improvável para quem vem do bairro de São Vicente, em São Paulo.


Confesso que, fazer com que os dois deixassem de ser uma referência foi uma tarefa difícil para mim. Mas, foi importante.


Assim como disse anteriormente, eu poderia escrever esse texto e deixar ele escondido em algum lugar até que eu esquecesse dele.


Mas, por mais que esteja doendo aqui, preciso falar sobre o que está acontecendo para não ter que lidar com os meus próprios silêncios quando casos (como os dois citados acima) virem à tona.


Assim como veio. E trata de uma (das poucas) referências negras masculinas que temos no Brasil atualmente.


Lembro de quando ouvi, pela primeira vez, o Silvio defendendo o Pelé quando pessoas (em sua maioria, brancas), cobravam um posicionamento de um intelectual negro abertamente opositor da ditadura (para quem não sabe, o Pelé é taxado como uma pessoa que foi conivente da ditadura). E, com elegância e inteligência, Silvio dizia que o Pelé foi o primeiro homem, negro e não europeu, a ter recebido o título de Rei do Mundo do Futebol.

Imagina ser chamado de Rei por um Suíço nos dias de hoje? Então, o Pelé era essa pessoa nos anos 70.


Além disso, a cada frase que ele dizia, a cada confronto que ele recebia, a cada texto que eu lia dele, eu tive a sensação de que ele também viria a ser um Rei.


“Ele”, o Silvio. Almeida, não o Santos.


Pela calma que aparentava. Pelo equilíbrio. E, principalmente, pela inteligência.


E, como é inteligente!


Mas, o soco invisível que recebi no estômago está doendo. Confesso que não acreditei quando recebi a notícia e, por algumas horas de reflexão em silêncio, me peguei pensando na inocência dele.


Acredito que não fui o único. Talvez, eu só seja o único a falar a respeito disso.

Ainda nessa reflexão, me lembrei dos fragmentos que escrevi para o Robson e para o Daniel e, imaginei que ele poderia ter mudado a vida do Silvio se ele tivesse tido acesso a eles.


Sou tolo, eu sei.


Mas agora, eu penso em como nós, homens, nascemos para nos proteger. E, consequentemente, no quão expostas todas as mulheres estão a sofrer uma violência. Em festas, em salas de aulas e no trabalho.


Além dessas reflexões em uma visão ampla e coletiva, o que intensifica a dor no estômago é a de ver três pessoas negras (assim como eu) abraçando o falso poder de uma lógica capitalista que, como sabemos, é desenhada para reproduzir ainda mais racismo.

Como foram tão tolos em acreditar que poderiam fazer tudo que tiveram vontade? Como foram tão inocentes em acreditar que o poder os tornaria intocáveis? Pensaram que eram tão poderosos a ponto de cometer crimes na Europa e saírem ilesos no Brasil? Ou, de cometer crimes no Brasil e saírem ilesos mesmo assim? Pensaram que eram quem? Musks? Dado Dolabellas?


Por favor, não estou dizendo que Silvio, Robson e Daniel foram acusados por serem negros. Eles foram acusados porque abusaram de mulheres. Dois já foram condenados e um perdeu o trabalho e tem recebido ainda mais acusações.


O que quero dizer é que nós, como homens negros que já nos vimos em Daniéis, Robsons, Pelés e Silvios, precisamos urgentemente contrapormos e falarmos cada vez mais duro em casos de violência sexual contra mulheres.


Termino esse texto com dor, mas com duas certezas: a primeira é que eu espero que isso mude a vida de quem está lendo; e, a segunda, é a que eu tenho certeza de que o Silvio não é meu último ídolo a ser desmistificado.

 
 
 

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