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Natural

  • Foto do escritor: Alayê Imirá de Brito
    Alayê Imirá de Brito
  • 23 de abr.
  • 3 min de leitura

natural em natureza
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Completei 16 anos de cultivo de dreadlocks neste mês. E qual é o significado disso?


Pessoalmente falando, significa que tenho mais tempo de vida com os locks do que sem eles. Mas, mais importante do que a matemática, é válido relembrar como era o Alayê que tinha certeza absoluta de que seria jogador profissional de futebol no Brasil de 16 anos atrás.


Nunca tinha imaginado que meu cabelo seria um problema na minha vida. 


As primeiras tranças surgiram aos 11 anos de idade (inspirado por atores do "Cidade de Deus" e "Cidade dos Homens"). Acho que todo mundo lembra do filme e da série, né?! 


Marcando o Brasil por serem tão premiadas e indicadas a prêmios naquele tempo ("Cidade de Deus" foi o último filme Brasileiro a concorrer ao Oscar antes de "Ainda Estou Aqui". Representações interessantes por trazerem um grande protagonismo de pessoas pretas naquela época. Podemos conversar sobre a representação dessas pessoas pretas não serem de forma tão positiva nos filmes, séries e novelas naquele tempo e refletir com os dias de hoje. 


Vou falar sobre isso ainda na superfície, mas podemos aprofundar em um outro momento.


Me recordo bem da cena de uma das premiações com os atores aparecendo de cabelos trançados, locks e black power. Naquele dia, decidi trançar o cabelo.


Os dreads vieram 5 anos depois e nunca mais saíram da minha cabeça. Com os dreads, passei a ganhar uma atenção redobrada da polícia desde aquela época. Ainda associado como um Laranjinha, Acerola, Zé Pequeno ou Bob Marley, mas nunca reconhecido como uma pessoa que era educado pela família e incentivado a preservar a cultura africana na apresentação pelo nome (quando apresentava os documentos), e na cabeça (literalmente).


Agradeço diariamente por ser filho de quem eu sou. Não só por isso, mas por isso também.


Com os dreads, vieram comentários ainda mais maldosos no campo profissional. Ouvi (e ainda ouço) milhares de vezes que o meu "cabelo não apresentava uma pessoa tão profissional” e que "cabelo de negão é raspado" - sem inventar muito.


Ao mesmo tempo, quem tem dreadlocks na cabeça, mesmo que de forma recente, entende que os locks têm poder de ensinar coisas que não se aprendem com cabelos raspados ou alisados. 


É difícil explicar, mas eu posso tentar falando pelo o que não é para depois falar o que é.


Não é estético e nem estático. Não é definido, mas te define. Não é moda, mas fica na cabeça de uns até eles se cansarem. Não é e nem está na moda - repito!


Ele acorda de uma forma e vai dormir de outra. Não cresce de forma linear e é importante entender isso para que o processo de aceitação seja respeitado por você, para depois ser aceito pelos demais. Ele te muda, te respeita e faz parte de você. Por mais que seja óbvio que nós somos um só, eu ainda o refiro em vida separada a minha. É mais do que parece e mais do que você possa imaginar. É a história que tentaram apagar de um povo etíope natural de África, e que nós passamos a preservar quando o cultivamos.


É o que sou e como me apresento desde os 16 anos de idade.

É sentimento e pertencimento! É natural!

É verdadeiro!

É diferente!


Para quem dizia sobre a falta de profissionalismo: me formei na faculdade e entrei no mercado de trabalho com ele. Posso ter “perdido” oportunidades de trabalho por tê-lo comigo, mas tenho certeza que seria muito infeliz estando em um lugar que eu teria que me adequar em tantas formas até não ser verdadeiro comigo mesmo. Então, não vejo como perda, neste caso.


Tenho acesso a salas de aulas com jovens adolescentes em escolas públicas que se identificam com o professor negro, e a salas de reunião com grandes tomadores de decisões para discutir o andamento de algum indicador.


São exemplos para além da estereotipagem que já me dão. Ressignificação de um Brasil racista que nos leu (e ainda nos lê) de forma negativa.


É uma forma de manifestar o meu respeito comigo e com a história coletiva que temos.


P.s: ao usar dreadlocks, locks, ou dreads neste texto - estou falando do meu cabelo, mas me referindo de forma diferente.


 
 
 

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